Cetose: o que fazer e o que não fazer

Postado em: 15/06/2023 | 6 min de leitura Escrito por: Luma Maria Souza Machado
Cetose é um estado metabólico onde o animal está em tal déficit calórico, que o fígado se encontra sobrecarregado (de tanta gordura para ser metabolizada) e que, após uma cascata de reações, implica em uma exagerada perda de peso e desidratação levando facilmente a morte, pois o organismo inibe o apetite e assim acentua mais e mais o déficit calórico e a desidratação.

Considerada um distúrbio de transição comum com prevalência entre 5-80% em fazendas leiteiras, a cetose é caracterizada pela elevada concentração de corpos cetônicos, como acetona, acetoacetato e beta-hidroxibutirato em todos os fluidos corporais.

Neste artigo, vamos conversar sobre o que fazer e o que não fazer em relação ao gerenciamento deste distúrbio.

Quais os sintomas da cetose?

Os sinais clínicos de cetose incluem anorexia (não ingestão de alimento), diminuição brusca da produção de leite, perda acentuada de condição corporal, fezes firmes e secas e, ocasionalmente, sinais neurológicos. É muito comum identificar vacas em cetose olhando o vazio (que estará extremamente fundo) e olhos fundos, além obviamente da atitude totalmente apática.

A cetose pode ser secundária a outras doenças de vacas em transição, como metrite, retenção de placenta e deslocamento esquerdo do abomaso, já que quadros clínicos em geral acentuam o déficit calórico comum ao pós parto. Portanto, monitorar o nível de cetose do rebanho pode alertar que o problema está presente e quão grande ele é.

Monitoramento da cetose no rebanho leiteiro

Para a incidência de cetose em vacas recém-paridas, é essencial a observação diária dos animais, pois essa é a medida mais rápida de diagnóstico não apenas de cetose, mas de outras doenças comuns ao momento do pós-parto. Garantir que animais sejam testados no rebanho com as fitas de teste são um recurso importante também. Se mais de 10% das vacas apresentarem níveis de cetona acima do padrão aceito de 14,4 ml/dL, o grupo é considerado com cetose.

Espaço de cocho adequado

O balanço energético negativo no pós-parto ocorre devido ao aumento abrupto da demanda energética para produção de leite e à não capacidade física da ingestão de matéria seca levando (já que o útero ainda está grande e o rúmen significativamente diminuído) à mobilização de tecido gorduroso e consequentemente à produção de corpos cetônicos (que são o coproduto dessa via metabólica).

É importante entender que praticamente todas as vacas recém paridas vão passar muito perto de um quadro cetônico, especialmente novilhas e nosso papel é evitar ao máximo que esse desafio seja maior do que é naturalmente. Pensando nisso, é importante dar acesso ao cocho para esses animais, que não estão a pleno vapor, especialmente vacas ou novilhas menores.

Portanto, ter um lote de pós parto é algo a se considerar, contanto que haja animais que justifiquem a separação. Em fazendas menores onde isso é impossível, é possível aumentar o espaçamento de cocho e mesmo separar animais de pós parto para fornecimento de dieta em local separado. O mesmo vale para a água, lembrando que quadros de cetose causam desidratação no animal, que provavelmente por conta do parto já ficou muitas horas sem ingerir água.

O espaço mínimo de cocho por cabeça é de 60 centímetros, porém pensando em dar mais conforto para os animais, pensemos numa medida de 80 a 90 centímetros, especialmente se a genética do gado for de maior peso e se houverem novilhas no lote. Em se tratando de Compost Barn, o espaço ideal de cama é entre (cerca de 11-14 m²) por cabeça, e em freestall deve permanecer em 1 vaca por baia.

Foco no período seco

Nos sistemas de produção leiteira, o período seco dura 60 dias e se dá de acordo com a data prevista de parto. Durante o período seco, a vaca prenhe recebe uma pausa na ordenha antes do próximo parto para repor as reservas corporais e regenerar o tecido secretor de leite após meses de ordenha.

Estudos mostraram que a falta de fornecer um período seco para uma vaca reduz a produção de leite na próxima lactação em 25-30% e aumenta o risco de doenças metabólicas, incluindo cetose efebre do leite e condições como deslocamento de abomaso.

Além disso, uma boa manutenção de registros é um pré-requisito para o gerenciamento adequado do período seco, já que o dia da inseminação, confirmação da prenhez e por fim previsão de parto são dados importantes para que os 60 dias sejam cumpridos sem prejuízo para o animal ou para a produção e leite

Trabalhar em estreita colaboração com veterinários e nutricionistas

Veterinários e nutricionistas ajudam os produtores de leite a identificar as possíveis causas da cetose e a lidar com essas questões. Como técnicos, estes devem esclarecer as causas mas mais do que isso, devem traduzir o conhecimento aos funcionários que estão no dia a dia da fazenda e que podem identificar casos rapidamente. O veterinário que vai apenas uma vez ao mês, por exemplo, deve confiar na anotação dos casos observados e ajudar na conversa sobre as possíveis causas e estratégias para reverter o quadro.

Os quadros de cetose são muito mais um caso de ser eficiente na prevenção do que estabelecer este ou aquele protocolo de tratamento, pois quando uma vaca precisa de intervenção ela em geral está exaurida metabolicamente, além do que a produção e saúde estarão prejudicados.

Escore de condição corporal

O monitoramento da condição corporal é uma ferramenta valiosa com impactos significativos no desempenho da transição e na prevalência de cetose. O escore de condição corporal ideal pós-parto varia de 2,75 a 3
Pontuações baixas e altas de condição corporal durante o período de transição aumentam o risco de cetose e prejudicam o desempenho reprodutivo. Vacas que parem gordas em geral já tem pouca sensibilidade a insulina que vem do período pré-parto e vacas que parem muito magras muitas vezes já estão em deficit calórico no pré-parto, acentuando-se no pós parto.

Sendo assim, recomenda-se monitorar o escore de condição corporal rotineiramente no momento da secagem, movimentação para pré parto , parto e saída do pós parto. O ideal é que a vaca não varie muito de escore ao longo desse período entre secagem e parto, pois ela naturalmente vai perder escore no primeiro mês após o parto.

Não misture vacas e novilhas

A mistura de novilhas e vacas mais velhas causa mais estresse as novilhas, levando a uma redução no consumo de matéria seca por competição e contribuindo ainda mais para acentuar o balanço energético negativo. Além disso, há uma hierarquia social nos rebanhos leiteiros, e mover uma vaca para um novo curral onde ela não está familiarizada pode adicionar estresse adicional.

Assim, é recomendável mover as vacas em grupo para que possam estar com outras vacas familiares. Quando a movimentação for necessária, lembre que o processo de hierarquização leva em torno de uma semana.

Tratamento quando necessário

Como mencionado, a cetose é uma questão muito ligada ao manejo e deve ser vista sempre como prevenção. Porém, especialmente em rebanhos de alta produção, a ameaça de quadros de cetose é sempre maior pois a curva de lactação de vacas especializadas começa muito mais inclinada.

Portanto, com a ocorrência de casos o crucial é seguir duas linhas de ação que são: Glicose e hidratação. Havendo ingestão de glicose o ciclo de queima de gordura e anorexia é quebrado e a vaca volta a ingestão da dieta. Havendo hidratação ela recupera o volume de fluido corporal, permitindo a manutenção da pressão sanguínea, sistema imune e funcionamento geral de órgãos e consequentemente da atitude de ir ao cocho se alimentar e voltar a beber água por si só.

Soro na veia com glicose só funciona para animais pequenos. Considerando uma vaca de 600 quilos desidratada em 10%, perdeu 60 Kg de fluido corporal. Sendo assim, um soro de 500ml não tem efeito praticamente nenhum. Neste caso, essa vaca precisa receber isso via intra ruminal por sonda e num volume em torno de 30 litros, duas vezes por dia.

Aproveitando essa quantidade de líquido é importante adicionar açúcar e eletrólitos se possível. É basicamente o que o drench faz, provê água numa quantidade que faz diferença para vacas desidratadas e glicose para quebrar o ciclo cetônico. Em geral, após uma ou duas administrações, o animal já se mostra muito diferente.

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