Gerenciamento de índices em fazendas: alimentação do rebanho

Postado em: 11/01/2018 | 9 min de leitura Escrito por:
A alimentação do rebanho e manejo nutricional de fazendas de leite é um tópico sempre debatido entre produtores, técnicos e agentes do setor em diferentes locais. Seja em encontros acadêmicos ou ambiente dentro da porteira (fazendas), a nutrição é sempre uma demanda “a ser resolvida”. Por quê a alimentação de rebanhos é sempre discutida? A resposta pode ser resumida em uma única palavra: custo. Em fazendas produtoras de leite a alimentação perfaz o maior montante do custo de produção de leite. Por este motivo, as mudanças realizadas na alimentação dos animais são sentidas, diretamente, no bolso do produtor seja em termos de ganhos ou aumento do custo de alimentação e, consequentemente, produção.

Ao longo dos nossos anos em atuação no campo percebemos um padrão comportamental comum entre produtores: a necessidade de se modificar, constantemente, uma ou mais dietas (no caso de sistemas confinados) ou formulação/quantidade fornecida de concentrado para sistemas a pasto visando a redução de custos de produção. Nosso objetivo no presente artigo é procurar esclarecer e melhor compreender o que chamamos de manejo da alimentação e gerenciamento da alimentação de rebanhos. Vamos à distinção destes dois conceitos:

Podemos chamar de manejo da alimentação o conjunto de medidas práticas que tomamos no dia-a-dia que envolvam a alimentação dos animais direcionadas para redução de custos com aumento de produtividade. O manejo da alimentação, em si, não se configura em modificar dietas ou propor novas composições diferenciadas, mas sim em enxergar como uma fazenda está funcionando “em termos operacionais” e de que maneira conseguimos otimizar esse trabalho, reduzindo custos. Quando modificamos um horário de trato, escolhendo uma melhor opção que propicie um melhor consumo, estamos atuando no manejo da alimentação. Quando melhoramos a qualidade da mistura de uma dada dieta, através de alteração na ordem de carregamento dos ingredientes, também estamos mexendo com: manejo. Ao alterarmos a divisão de lotes de vacas em produção, realizando separação dos animais por tempo de lactação (DEL) e produção de leite, atuamos em manejo e assim por diante. Temos uma série de medidas e exemplos que podem ser enquadrados como boas práticas ou recomendações que, normalmente, impactam no resultado final. Em linhas gerais, trabalhar com o manejo da alimentação uma maneira simples e, em muitos casos, a mais barata e eficiente para maximizarmos a produção de leite.

Classificamos o gerenciamento da alimentação de rebanhos como o conjunto de ações e controle sobre o manejo a alimentação que possibilitem um bom controle de custos associados aos indicadores produtivos que nos levem à tomada de decisões sobre as dietas fornecidas aos animais. Gerenciar bem a alimentação de rebanhos significa coletar dados e números capazes de serem transformados em índices que podem nos auxiliar a tomar decisões importantes sobre as dietas fornecidas e qualificar o trabalho da fazenda, como um todo. Através do gerenciamento da alimentação, sim, um técnico tem condições de propor uma mudança de dieta, ou não. Uma pergunta que todo produtor deve realizar antes de desejar modificar sua dieta é: por que estou querendo modificar minha dieta? Com quê fundamento? Se a resposta imediata for: para baixar meu custo de alimentação, cuidado.

Como gerenciar a alimentação de um rebanho?


O primeiro passo que um produtor deve tomar para melhorar a eficiência da alimentação dos seus animais é conseguir fazer a distinção, de forma clara, dos conceitos acima e procurar trabalhar com profissionais que tenham conhecimento e experiência no campo e que busquem sempre a melhor opção atendendo os interesses da fazenda e do produtor. Como colocado no início deste artigo, o caminho mais simples e usual é a troca de uma dada dieta para como a melhor solução para aumento da produção de leite. Nosso sistema de trabalho e foco de atuação (COWTECH-CONSULTORIA) é completamente diferente. Antes de qualquer atitude e/ou proposta para uma determinada fazenda (Sistema de Produção), procuramos realizar uma leitura geral do manejo atual empregado, procurando responder questões associadas ao manejo da alimentação, como:

a-) Quantas ordenhas são realizadas?
b-) Quantos tratos são realizados?
c-) Quem realiza o trato (sempre o mesmo funcionário ou funcionários distintos)?
d-) Que horário os tratos são realizados?
e-) Quantas dietas são utilizadas (formulações/misturas), na propriedade?
f-) Como o trato é carregado (sequência de carga) e, em quanto tempo cada carregamento é realizado?
g-) A fazenda trabalha com carreta, vagão TMR ou distribuidor (apenas)? Qual é o estado de conservação e funcionalidade dos equipamentos utilizados?
h-) Como é realizado o controle da quantidade de alimentos a serem misturados? (os alimentos são pesados? Os instrumentos de pesagem estão aferidos?)
i-) A propriedade realiza pré-mistura de algum componente da dieta (trabalha com sala de ração/elabora concentrados)?
j-) Existe controle de sobras? O consumo de alimento (MS) é estimado/caculado?
k-) A quantidade de alimento (mistura) fornecida é constante (estabelecida pelo técnico) ou alterada, conforme consumo diário de MS?
l-) Se existe alteração no fornecimento de MS? Quem realiza esse controle (leitura de cocho)? Quais são os critérios para aumento ou redução da quantidade fornecida?
m-) O espaçamento de cocho para cada lote arraçoado é adequado?
n-) Para animais em produção quais são os critérios de separação de lotes? (primíparas x multíparas, produção e DEL/como é feito esse arranjo)?
o-) Como está a eficiência alimentar dos lotes alimentados?
p-) Como está o escore de fezes dos lotes alimentados?

Através da compilação das respostas acima, associada aos dados de custos dos ingredientes e das dietas fornecidas, somos capazes de calcular outros indicadores de eficiência da alimentação de rebanhos e iniciar um trabalho consistente de gerenciamento da alimentação.

Aos trabalhos com o gerenciamento da alimentação de rebanhos procuramos alertar os produtores para questões importantes como a conversão alimentar ou, simplesmente, eficiência da alimentação (kg de leite produzidos/kg de MS consumidos) e eventuais propostas de redução de custos. É muito comum, visando a redução de custos, alguns técnicos ou produtores buscarem a substituição de ingredientes mais caros em por alimentos ou subprodutos mais baratos. Cabe ressaltar que o comportamento dos alimentos dentro do “sistema animal”, em si não é linear. Determinadas combinações de alimentos e dietas apresentam melhores respostas do que outras. A composição de um alimento mesmo com teores semelhantes é diferente uma da outra. Em alguns casos é possível realizar a substituição, sim, sem grandes impactos. Em outros casos, não.

A simples troca em função de custos deve levar em consideração não só a simples redução dos mesmos mas também a capacidade de manutenção da produção ou mesmo aumento, desta. Caso contrário o produtor está “se enganando”. Redução de custo de alimentação implica em manutenção da produção com menor desembolso ou aumento de produção com menor desembolso. Vale lembrar que em alguns casos podemos propor um aumento no desembolso e conseguir proporcionar uma melhoria nos resultados. Logo, devemos analisar os números com critérios. Os números abaixo servem como base para melhor elucidar os conceitos debatidos:

Tabela 1. Dados:


Tabela 2. Indicadores calculados (com base nas informações):


Tabela 3. Indicadores de Referência (Eficiência da Alimentação):


Tabela 4. Indicadores de Referência (RMCA):



Nas Tabelas 1 e 2, acima, criamos uma situação hipotética comparativa entre 2 fazendas (A e B). Para que possamos fazer uma análise correta precisamos verificar se os indicadores avaliados são, de fato, comparáveis. Sistemas de produção diferentes, com médias de produção diferentes por diferentes motivos como: perfil de rebanho, conforto oferecido, tipo de alimentação fornecida (TMR ou não) e estágio de lactação (DEL = dias em lactação) afetam, significativamente os números e conclusões obtidas. Podemos reparar no exemplo acima que as bases são comparáveis, pois são sistemas semelhantes com animais semelhantes com mesmo DEL médio. A diferença fica por conta do custo de alimentação e do preço recebido, variáveis que são quase sempre diferentes (de fato). Mesmo com um custo de alimentação maior, em função de um investimento maior na alimentação (R$15,50 x R$10,50/cab/dia) e com um menor preço recebido por litro de leite, o RMCA da Fazenda B é melhor do que da Fazenda A. Se analisarmos somente a dieta fornecida, o desembolso do produtor A é menor do que do produtor B, porém este último é mais eficiente. Mesmo com custo de alimentação (R$/L) maior, suas vacas são mais eficientes em termos de conversão. Para cada kg de MS consumida as vacas da Fazenda A produzem 1,07 litros de leite e na Fazenda B (mais eficiente), 1,46 litros. O resultado prático é a maior sobra de recursos para bancar os demais custos de produção. Como são fazendas, teoricamente semelhantes e comparáveis, a conclusão e diagnóstico inicial que chegamos é de que a Fazenda B, possivelmente, tem um melhor manejo de alimentação ou que, simplesmente tem uma dieta mais ajustada, mesmo que mais cara do que a Fazenda A.

Cuidados na avalição de indicadores:


O primeiro cuidado que todo produtor e técnico deve tomar é saber: quais números devemos levantar ou quais são os números possíveis de serem levantados em seu sistema. Este raciocínio nos direciona à questão da qualificação da mão-de-obra empregada no manejo da alimentação. Para que possamos ter números é necessário controle. Para que possamos ter controle é necessário ter disciplina (anotações). Para que tenhamos disciplina é necessário ter vontade (de trabalho). Para que tenhamos vontade é necessário: motivação. A combinação destes fatores nem sempre faz parte da realidade prática vivenciada por produtores e cabe ao técnico e consultor responsável a sensibilidade dessa análise. Em alguns casos, antes de qualquer atitude é necessário dirigir esforços e atenção para a qualificação dos funcionários envolvidos (treinamento) como ponto de partida. Uma vez superado este desafio, quais serão os controles diários?

O produtor deve ter conhecimento, também, de que alguns indicadores, como RMCA sofrem impacto direto do preço recebido pelo litro de leite, média de produção (DEL) e preço das commodities utilizadas como ingredientes nas dietas. Outros como eficiência da alimentação sofrem impacto direto com a qualidade do manejo e capacidade de ingestão de alimentos, associados ao DEL médio de cada lote. Animais no terço inicial de lactação tendem a ser mais eficientes que animais no final de lactação sendo. Estabelecendo bases comparáveis em relação a medição constante desses índices, o produtor passa para um outro nível de gerenciamento do seu negócio, uma vez que suas decisões deixam de ser empíricas e passam a ser fundamentadas por parâmetros.

Este artigo foi escrito pelos fundadores da Cowtech, que são instrutores do EducaPoint. Ambos ministram o curso online “TMR na alimentação de vacas leiteiras: dicas práticas para melhores resultados”.

Neste curso, os especialistas em produção animal, João Paulo V.A. dos Santos e Paulo Stacchini, explicam com demonstrações práticas como realizar o correto preparo, carregamento e distribuição da TMR, quais os pontos críticos e falhas mais frequentes no processo, como mensurar o consumo pelos animais, além de ensinar aos alunos como fazer o gerenciamento de TMR´s, garantindo eficiência operacional, estabilidade no fornecimento de nutrientes aos animais e maior rentabilidade para o sistema de produção.

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